E acabei bebendo de novo, mais do que deveria, mais do que a
alma de um perdido pode aguentar, foi então que entre a embriaguez e podridão
fechei meus olhos e comecei a sonhar, meio inconsciente, meio acordada. Ao
fechar meus olhos ele caminhou até mim e beijou uma moça sem rosto. Ele não é
nenhum dos homens que já vi na vida, seus cabelos raspados em volta, algo como
um moicano sem forma e olhos negros, apenas caminhando através do sonho como
uma sombra que perpassa por todas as imagens noturnas sem que eu possa
perceber, como um detalhe na sombra. Resolveu me cumprimentar desta vez e, no
entanto, tocando o caos ao me reconhecer, assumindo todas as faces de todos os
seres de cada sonho, como um camaleão que perpassa na dor do meu inconsciente solta
frases nunca ditas antes quando ele era somente um figurante despercebido em
todos os meus sonhos. A porta range, abro meus olhos, ele parte. Nada resta
aqui no quarto escuro além de lembranças, além de seca, além de ausência e um
acumulo de ressacas misturada a quentura de sequenciais doses de jack daniels
durante a tarde. Na noite de sábado, o último dia de Saturno no ano, me
encontro só no escuro abraçando a garganta escura do tempo que me engole em
sonhos irreais. O ser que me visita é meramente um reflexo de algo que não sei
compreender, que joga meus medos em minha cara e todos os amores que desconheço
e a dor que não deixei partir. O parceiro de minha cama e meus sonhos, a
garganta que me engole na escuridão, o senhor da minha vida, o beijo da morte, o
tempo.
sábado, 27 de dezembro de 2014
INSENSATEZ
Queria expressar o que sinto e deixei mofar
Pois cada emoção que esboço ou canto
É uma faca afiada de lâmina cega
Contando a dor no final a me borrar
E o que há para ser dito?
Esgotei todas as palavras
Esperei mais que minhas pernas
Puramente cansadas poderiam esperar
Ignorada em indulgência mais uma vez
No silêncio diferente da voz que tirou a paz
Pois ao cortar ciclos todos temos certezas demais
Das quais senti pesar em meio peito que se desfez
Não sei suportar silêncios mais uma vez
pois agora já não parecemos tão certos
E na solidão da embriaguez em desertos
Volto a me matar lentamente em insensatezsegunda-feira, 22 de dezembro de 2014
Quatro Meses de Lembranças Desmemoriadas
Um
janeiro vomitando felicidades
Ainda
chorava sobre cordas de violino
Abandonando
defuntas deidades
Na fraqueza dos olhos me inclino
Na fraqueza dos olhos me inclino
Fevereiro de
dores apagadas
Sobre jogos de dor e instinto
Dormem sonhos de névoa mofada
Queima a garganta de vinho tinto
Março já não
caiem mais águas
Sem chuva,
sem aura, sem hinos
Três vezes
me acabo marcada
Por devassos
sonhos banidos
Abril é uma
nova arrancada
De sonhos,
de amor, de partir
Em lástima
sigo encerrada
Em lágrimas
me ponho a dormir
Sigo
perdurada em felicidades
Sem violinos rasgados ao fundo
Deveria encontrar a paz das deidades
Ao invés de
praguejar meu desejo profundo
Da alma
putrefata pelo esquecimento
Das dores apagadas pelo banimento
Das cores banidas de si mesma
Nem vingança ainda tento
Nem ao menos me contento
E a felicidade é um lamento
Perdida e
apagada de meu intentoNÔMADE
Olhava os barcos na água enquanto me preenchia da brisa costeira
Meu choro de água salgada, na janela perdida naqueles instantes
Enquanto me afundava na banheira, a sempre afogada errante
naquele apartamento ou lar antigo na rua Marquês de Abrantes
Minhas moradias são meros instantes, de passagem e grito
A alma nômade é caminhante, meu peito é apenas bagagem
Com círculos retorno pela mesma viela, na roda fortuna do rito
Meus olhos cansados de caminhar ganharam mais idade
Os motivos que a este círculo me prendo a caminhar
As raízes que eternas me fazem prontamente voltar
Podem se perder em erva daninha da montanha,
pois eu continuo a nômade estranha, abandonada e só a voar
E nesse meu caminhar errante o destino me faz curva
pois o suor de minha labuta, me envelheceu no lugar
da esperança absoluta de que tudo sempre irá retornar
E sem pertencer a nenhum lar no fim a roda sempre joga
No eterno passo perdido, no peso duro de meu caminhar
sábado, 20 de dezembro de 2014
FOGUEIRA
Quero a fogueira
Que me tire da beira
Da estrada
Sonhei com você
Na meia luz da madrugada
E no palco azul te vi cantar
Enquanto eu me perdia
No vazio em blues
No mesmo lugar
Quero a fogueira
Que me tire da beira
da estrada
Além de outra noite
Em que me perco embriagada
Na madrugada sem lar
segunda-feira, 1 de dezembro de 2014
Fragmento
Que os rios corram sempre até o encontro na mata
Que as borboletas e o fogo no céu tracem sua glória
Que o destino sempre enlace esta história
Que enlace em cura e luz nossa jornada
Que a lua nos ilumine prateada
Que a dor nos ombros seja crescimento
Que nossas raízes juntas sejam plantadas
Que nossos votos transcendam o esquecimento
Que pela eternidade possa ser tua cura
Que a luz ilumine a estrada escura
Que sem pertencer seja meu e da lua
Que sem perecer eu seja do sol e tua.
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